quarta-feira, maio 24, 2017

Mudam-se os tempos...

Eles andam por aí. Rastejam sobre duas patas carregando uns expositores com rodinhas onde expõem uns escritos ranhosos oferecendo felicidade a troco de devoção total. Devoção a um deus merdoso que só existe lá na igreja deles.

São os modernos evangelizadores da treta, pobres diabos mal disfarçados de anjos. Trazem asas presas no rabo, asas que arrastam pelo chão. O Verbo não os ilumina. A igreja que representam é um negociozito tão mal amanhado que só pode atrair os analfabetos e os desesperados por um pouco de conforto. Seriam dignos de dó, não fossem tão assanhados e convictos de serem os israelitas dos subúrbios.

Os antigos encomendavam-se a Deus implorando boas colheitas e uma Natureza benévola. Os modernos pedem-Lhe bons negócios e um emprego. É a diferença entre uma sociedade agrícola, na qual os seres humanos viviam com as ventas enfiadas na terra e uma sociedade urbana, na qual os seres humanos vivem com as ventas enfiadas nos mass media.

Sinto-me acabrunhado.

quarta-feira, maio 17, 2017

Escárnio e maldizer (com final esperançoso)

Durante anos venderam-nos a ideia de que Portugal seria o "bom aluno" da Europa. O que caracterizava o nosso país para merecer tal designação?

Ser subserviente, fazer sempre aquilo que era esperado que fizesse e obedecer sem questionar as ordens vindas de quem era suposto mandar. Obedecer e, para ficar mais bonito aos olhos dos grandalhões, ser ainda mais severo consigo próprio do que aquilo que lhe era imposto. Um toque de masoquismo: abraçar o sacrifício com aquela alegria beata dos gajos que se autoflagelam para expiarem os seus pecados.

O bom aluno da era cavaquista copiava com atenção o que o mestre escrevia, nem que o escrevesse nos tomates, e reproduzia com a exactidão que as suas vistas curtas lhe permitissem tudo aquilo, mesmo que não percebesse bem que raio de merda estava a fazer. O mestre escreveu é porque é importante. Assim se comporta o bom aluno.

O bom aluno não tem opinião ou, se a tem e não coincide com a do mestre, fica calado, engole e faz de conta que não se passa nada. De facto, com o bom aluno, nunca se passa nada.

Quantos anos perdemos nós a ser governados por estes borra-botas, estes pichas-murchas, alforrecas corcundas, seres destituídos de coluna vertebral? Ainda por cima havia uns quantos ladrõezecos entre estes bardamerdas enfatuados.

O puto Salvador mostrou, num contexto muito diferente, é certo, que andar a lamber a cartilha do mestre nem sempre dá bom resultado, nem sequer é uma atitude particularmente inteligente. Quem não tivesse percebido talvez tenha agora compreendido que arriscar ser quem somos pode ser a melhor forma de alcançar o sucesso. Só temos de valer alguma coisa e acreditar em alguma coisa que se pareça com a Verdade.

segunda-feira, maio 15, 2017

Um gajo esquisito



Finalmente Portugal conseguiu um objectivo muito antigo (na época contemporânea 53 anos corresponde à quase totalidade do tempo bíblico) e um cantor luso venceu o célebre Festival da Canção ou da Eurovisão, não tenho bem a certeza da designação actual.

Quando eu era puto o Festival era um acontecimento do caraças. A família reunia-se na expectativa de que alguém pudesse reparar no nosso artista, rezando para que, pelo menos os espanhóis, votassem na nossa cançãozinha. Por favor senhores...

Mas a coisa nunca resultava e o pessoal ficava a matutar nas razões que estariam na base de tanta indiferença para com os nossos artistas da cantoria: que o problema era esta nossa língua (demasiado bela ou demasiado complexa, conforme as opiniões), que o problema era o arranjo musical, demasiado antiquado, que a gente não era nunca capaz de acompanhar o ar dos tempos, mil e uma explicações que seriam esquecidas no ano seguinte durante um bocadinho, o bocadinho que durava a tal esperança de sermos notados.

Fui crescendo e deixei de ver a coisa. Para um jovem amante de boa música o Festival era algo execrável: uma merda! E quem quer enfiar merda pelos ouvidos dentro?

Agora que estou... crescido, por assim dizer, já não temo que me caiam os parentes na lama só por prestar atenção ao dito concurso musical. Em boa hora pois, por uma vez na vida, Portugal, através de Salvador Sobral, conseguiu superar todas as expectativas vencendo a coisa.

O rapaz, que é um anti-herói, tornou-se um herói nacional. Já tudo foi dito e redito sobre tão feliz desenlace mas o que me deu especial prazer foi que o tão ambicionado troféu foi conseguido por alguém que se distinguiu da massa através de uma original estranheza.

Sempre que se tentou copiar as formas consideradas canónicas para parir um objecto musical capaz de ombrear com os "estrangeiros" o resultado foi pouco menos que patético, horripilante na maior parte das ocasiões.

Quando Salvador venceu o Festival cá do burgo houve logo quem gozasse com o aspecto dele, com a forma esquisita como interpretava a canção. Habituados ao fracasso imaginavam mil e uma maneiras de minimizar a personagem que iria representar, mais uma vez, a desgraçada miséria nacional.

Mas, desta vez, não foi assim. Salvador venceu e mostrou que ser um gajo esquisito não é, obrigatoriamente, um factor negativo. Antes pelo contrário.

sábado, maio 13, 2017

Momento (pouco) zen

Cada um de nós é fruto de uma determinada árvore genealógica. Pendemos dos ramos da nossa árvore com aspecto mais ou menos apetecível, dependendo da fome de quem nos olha. Estamos neste mundo para comermos e sermos comidos. Sim, somos frutos carnívoros.

A complexidade patética do ser-se humano é tão grande que não percebemos nada. Não sabemos de onde vimos, não sabemos onde estamos... como poderemos, sequer, imaginar para onde vamos?

Esta cena deixa-nos assim, como somos: desprotegidos, vulneráveis; desorientados. Olhamos em redor procurando algo que nos ilumine, qualquer coisinha que alumie tenuemente as trevas que envolvem esta nossa condição.

A muitos de nós custa a crer que a vida seja isto. Que seja só isto. Temo bem que seja assim.

sexta-feira, maio 12, 2017

Perguntem ao Chico

Fátima, Fátima... Fátima. Nos últimos dias, como sempre acontece por esta altura, não se ouve falar de outra coisa. Este ano o falatório começa a chatear de tão intenso, pois temos entre nós o Santo Padre, o Papa Chico.

O Chico vem para canonizar os pastorinhos. Ok, o gajo é o boss da igreja católica, está a desempenhar o seu papel. Terá o Santuário apinhado de ovelhas, as do seu rebanho, uma espécie de Woodstock religioso. A coisa promete.

As dúvidas que me fazem cócegas na cachimónia é: o Chico acredita mesmo nesta cena das aparições em Fátima? É com convicção que vai enfiar mais 3 bonequitos na prateleira dos santos católicos?

Gostava de poder perguntar-lhe estas coisas mas, como não dá para chegar à fala com o amigo Chico ficarei para sempre com as dúvidas enfiadas na garganta.

Alguém que possa que lhe pergunte e depois diga qualquer coisinha. Gostava mesmo de saber, porra!

sábado, maio 06, 2017

Sob um céu cinzento

Tiramos a religião a uma comunidade e o que lhe deixamos em troca? Sai Deus do cadeirão mais elevado do Tribunal e quem lá vai sentar o cu? A coisa é complicada. A Lei divina substituída por um Código Penal trabalhado por homens pouco escrupulosos é a resposta a que temos direito?

As grandes catedrais foram substituídas por centros comerciais. As famílias deslocam-se em peregrinação dominical aos McDonald's de todos os tipos, a devoção à Palavra é transformada em devoção ao Consumo. Isto é complicado, caraças.

Teremos, de facto, matado Deus? Ou Ele, simplesmente, amuou e foi pregar para outra freguesia? Talvez tenha criado outro tipo de vida capaz de O adorar nalgum planeta longínquo e tenha agora a forma de uma lula ou de um veado com asas de morcego, uma coisa assim, tão incompreensível para nós, seres humanos, como nós seremos para as espécies alienígenas que eventualmente existam algures no Universo.

A desagregação do espaço humano vai corroendo o Mundo, a Lei de Lavoisier aplicada à escala da existência da nossa espécie, este mundo que se achata e vai perdendo a esfericidade sob um céu muito cinzento.

terça-feira, maio 02, 2017

Dada Combatendo a Maldade

Passei a última hora a tentar recolher dois ou três textos deste vosso 100 Cabeças que possam servir de apoio a quem visitar a próxima exposição de desenho que vou realizar conforme consta na imagem acima.

Clico na etiqueta "arte" e, catrapunfas, logo surgem 229 textos que fui escrevendo ao longo dos anos neste blogue. É muita coisa, a escolha decerto terá sido difícil.

Nem por isso. Mais difícil foi escrever este post sem parecer lamechas.