quarta-feira, agosto 31, 2016

31 de Agosto

Com o final de Agosto regressam pessoas. Pelo menos é essa a sensação que tenho após algumas voltas pela cidade e arredores, agarrado ao volante do meu carro. Pareceu-me haver mais movimento e, sobretudo, um aumento muito acentuado dos níveis de stress que por aí andam.

Manobras automóveis mirabolantes, daquelas de arrepiar pelo desrespeito absoluto que representam seja às regras de trânsito seja à vida alheia; velhinhos e velhinhas em fila para jogar na raspadinha e um gajo à espera para poder comprar o jornal; grupos de pessoas a falar alto, narrando peripécias das férias na mesa do café, outras fazendo o mesmo gritando para o telemóvel; mais carros em cada cruzamento, em cada rua, em cada avenida; uma estranha sensação de preenchimento. Ainda assim, tudo na paz do Senhor.

Terminam as férias, regressa a ansiedade?

terça-feira, agosto 30, 2016

Ego

O reconhecimento faz-nos assim tanta falta?
Se calhar faz. Ou talvez não, já não tenho a certeza.

Um gajo precisa de ter um ego do tamanho de um autocarro para acreditar em si próprio, sem dar muita atenção ao facto de praticamente não existir.

domingo, agosto 28, 2016

Reflexo solar

Há um conceito um pouco vago e bastante maleável, plástico mesmo, que é o conceito de Cultura. A Cultura constrói-se, não se colhe na Natureza, não é uma coisa selvagem. Assim, num misto de tradição e de inovação, cada sociedade humana constrói a respectiva Cultura. 

A aceitação de uma determinada Cultura não é obrigatoriamente pacífica.

sexta-feira, agosto 26, 2016

Dúvida existencial

Há dias em que me sinto sozinho. Sozinhinho, como dizia quando era criança e queria expressar aquela angústia que nos provoca a sensação de abandono e que, por sermos crianças, não dói tanto quanto virá a doer mais tarde mas já incomoda pra caralho. Um gajo é puto mas compreende mais ou menos.

Esta solidão é abstracta. Estou acompanhado, há muita gente, gente por todo o lado, mas a sensação de estar só mordisca-me o coração. É como se fosse adolescente outra vez ou nunca tivesse deixado de o ser realmente. Sinto que não tenho ninguém a quem possa explicar, com um mínimo de exactidão, as angústias que me trespassam a alma e que, caso tente fazê-lo, vou soar pedante e presunçoso.

Poderei alguma vez sentir-me um adulto completo? Em boa verdade: o que é isso?


quarta-feira, agosto 24, 2016

Informação

As notícias nos jornais reduzem-se a cabeçalhos. A vida vai boa para os míopes que, assim, conseguem ler tudo o que é importante. Aquelas letrinhas pequeninas, debaixo da gordalhufas que fazem os títulos, as pequeninas não interessam nada. Só chateiam.

Depois temos os canais televisivos de informação. São horas e horas de emissão que é necessário preencher dê lá por onde der. Os tais cabeçalhos dos jornais reproduzem-se nestes canais que funcionam como câmaras de eco; o cabeçalho uma, duas, três mil vezes repetido até ao final do dia.

Amanhã o assunto será outro.

Há sempre uma notícia mais importante (é a que consegue mais tempo de antena) e o tema vai mudando. É necessário satisfazer a gula por novidades que caracteriza os cidadãos que são mais consumidores que cidadãos. A ponderação e a reflexão são entregues a especialistas que enxameiam os écrãs como moscas da fruta num laboratório científico.

As histórias são mastigadas até nos serem devolvidas num autêntico vómito.

Estou cansado desta merda.

segunda-feira, agosto 22, 2016

Regresso

Sinto o tempo a regressar.
Os dias recomeçam ignorando o dia de ontem, imaginando dolorosamente o dia de amanhã.
Dentro do meu peito há coisas que se comprimem, coisas que se encostam umas nas outras, coisas que causam incómodo.
Sinto o tempo a regressar.
Vem montado nos ponteiros de um relógio anacrónico, qual fantasma sussurrando na vertigem de um mostrador digital, o tempo regressa e, com ele, vêm tantas coisas que havia já esquecido!
O meu corpo reconhece-se no espelho que é o regresso do tempo.
O mundo volta a ficar teimoso.

Esta sensação faz de mim eu, outra vez.
Sinto que regresso com o tempo.

domingo, agosto 21, 2016

Olímpico

Aos atletas portugueses que competiram nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro quero agradecer terem-me feito acreditar com eles que é possível ir até ao fim.

Mesmo que não tenham vencido as suas provas, ainda que tenham fracassado completamente ou quase alcançado a glória, estive com todos e cada um deles, como se tivesse viajado até ao estádio, como se me tivesse materializado no pavilhão, como se tivesse sulcado as águas numa velocidade alucinante.

Agora que os Jogos chegam ao fim apercebo-me que, mais do que nunca, os atletas portugueses puderam sonhar e seria injusto que não tivéssemos sonhado com eles.

A vitória não é mais do que um pormenor.

domingo, agosto 14, 2016

Vergonha

A história repete-se todos os anos. Verão é sinónimo de desgraça.

Os incêndios florestais saltitam um pouco por todo o território nacional, continente e ilhas atlânticas não escapam a esta estúpida fatalidade do destino. É em ocasiões como esta que podemos concluir em definitivo que o destino é mera consequência dos acontecimentos diários e que o destino dos homens e das suas coisas depende do que os homens fazem, não fazem ou poderiam ter feito.

O aproveitamento vampírico que os meios de comunicação de massas fazem desta desgraça é nojento. Não há acontecimentos mais importantes nem mais dignos de nota do que a miséria simbolizada pela bestialidade dos incêndios e a desolação das cinzas fumegantes.

Sinto vergonha.


sexta-feira, agosto 05, 2016

Palavras não bastam

Sentir um adorzinho nos olhos, uma nuvem de não-sei-bem-o-quê logo atrás, em direcção ao cérebro, uma grácil ternura em relação ao mundo todo... gosto de certas tonturas quase tanto como gosto de certas tontices.

Não ter responsabilidades imediatas, poder desligar o modo "sério", ser um pouco mais louco do que estou normalmente disposto a ser. Estas coisinhas são pequenas fontes de prazer imediato.

Poder não fazer nada, poder fazer tudo ou quase tudo o que imagino ser capaz de fazer. Desligar daqui, ir para ali, já ali! Pairar como uma nuvem, voar como uma serpente, rastejar como um elefante adormecido.

As palavras não chegam lá.

A felicidade pode ser um lugar solitário. 

terça-feira, agosto 02, 2016

Do caderninho


Andar muito tempo na Lua tem os seus custos. Perde-se alguma gravidade.