domingo, setembro 06, 2015

Peito feito

É na próxima 6ª feira, 11 de Setembro, data de má memória para este mundo que tento meter dentro das coisas que faço. É na próxima 6ª feira que tenho marcada a inauguração de uma exposição com trabalhos da minha autoria. Pinturas, fotomontagens em photoshop, desenhos, colagens, objectos que criei ao longo de anos. As datas não interessam para nada.

O local é o foyer do Teatro Estúdio António Assunção, em Almada. Não é um espaço particularmente nobre. Mas eu também não sou nenhum princípe das artes. Quero que se foda. Só quero apresentar algo que seja digno de ser apresentado, que me faça justiça, que mostre como sou um gajo empenhado nesta merda.

Mas porquê? Porque faço a exposição? Porque sou um gajo empenhado nesta merda? As perguntas são fáceis, as respostas nem por isso. Será tudo isto fruto de uma mera e intensa vaidade?  Se me ponho a matutar demasiado nestas questões traiçoeiras acabo agarrado à cabeça, cotovelos apoiados na mesa e olhos fechados para não ver nada que esteja fora da minha mona.  O equivalente ao mito da avestruz com a cabeça enterrada na areia.

Vou espalhando objectos pelo atelier. Ora sinto uma forte convicção, ora sou amolecido por uma sensação merdosa de que tudo isto não serve para nada. Mas as coisas são o que são e os compromissos, para mim, são tudo. Comprometi-me a montar esta exposição. Portanto está tudo dito.

Não há tempo para dúvidas nem para questões retóricas nem para filosofias covardes. Agora trata-se de seleccionar e montar os objectos. É isto que eu vou fazer. O resto... o resto logo se vê.

terça-feira, setembro 01, 2015

O Arco da Governação

Em Portugal existe uma coisa terrível chamada “arco da governação” que é um artefacto transformador de políticos. O “arco da governação” funciona como uma espécie de portal entre o mundo das boas intenções e o universo da política pura e dura. Ao atravessar este arco, pessoas honestas são, quase sempre, transformadas em aleijões morais. Outros (Miguel Relvas ou José Sócrates, por exemplo) não sofrem a mínima alteração.

Quando um político atravessa o “arco da governação” e dá por si naquele instável universo, onde Não Há Alternativas (NHA), faz coisas extraordinárias tal como Kal- El debaixo de um sol amarelo se transforma no Super-Homem. Lembremos quando “Telmo Correia assinou cerca de três centenas de despachos como ministro do Turismo na madrugada do dia em que o novo executivo, liderado por José Sócrates, foi empossado (…) (Público,3/2/2008). Já refeito deste assomo de actividade frenética, Telmo é hoje um homem ponderado e recuperado para a boa governação. Podemos vê-lo com frequência a perorar sobre os mais variados assuntos num canal de TV noticioso. 

Tal como Bagão Félix que teve um momento de vertigem que levou “(…) Souto Moura [a encarregar o procurador-geral adjunto Azevedo Maia] de esclarecer os contornos do negócio (a adjudicação do Siresp) que os ex-ministros da Administração Interna e das Finanças, Daniel Sanches e Bagão Félix, respectivamente, assinaram três dias após as eleições legislativas de 2005. (Público, 14 /11/2006). 

Quem vê, nos dias que passam, Bagão Félix a emitir as suas pias opiniões no tal canal de TV ou aqui no Público, tem dificuldade em compreender que raio de coisa lhe terá passado pela cabeça naquela época conturbada para ter adjudicado o negócio, em Fevereiro de 2005, por 538 milhões de euros. É certo que por lá andavam metidos Dias Loureiro e Oliveira e Costa, à época “pessoas de bem”, conforme nos assegurava Cavaco e Silva, mas… valeu-nos o então novel ministro da Administração Interna, António Costa, que, recorrendo aos poderes adquiridos ao transpor o “arco da governação”, acabou por adjudicar o “Siresp ao único consórcio candidato, retirando algumas funcionalidades ao sistema, que desta vez custou 485,5 milhões de euros (Público, 14 /11/2006); ah, valente! Ainda assim, o Estado português acabou com um ruinoso negócio em mãos Investindo “(…) cinco vezes mais do que poderia ter gasto se tivesse optado por outro modelo técnico e financeiro.” (Público,2/6/2008) negócio que ainda hoje andamos a pagar com língua de palmo.

Há tantos outros casos que poderíamos recordar (oh, o clássico das 61 mil fotocópias, o aeroporto no deserto “jamais”, a Lusoponte…) mas penso que fica provado que o “arco da governação” é uma armadilha mortal para a honestidade dos animais políticos.