domingo, maio 13, 2007

Iconofilia


Todos os anos é a mesma coisa e repete-se a romaria. Os católicos acorrem aos milhares a Fátima, lugar santo onde aconteceram coisas extraordinárias em tmpos que já lá vão. Para quem acredita em aparições e outros fenómenos sobrenaturais, Fátima é de visita obrigatória.
Tudo começou com os pastorinhos que viram a Virgem repetidamente e com ela falaram e a ela rezaram. Dois deles, os que faleceram quase imediatamente a seguir às aparições (aquilo deve ter-lhes sugado muita energia vital, pobres crianças, não é à borla que se assiste a um espectáculo daqueles!) foram recentemente canonizados. São agora "santinhos" de pau, representados com aquela expressão vazia, de olhar perdido, herdada das estátuas gregas da antiguidade por via das cópias romanas. Pela cara tanto podem ser o Francisco e a Jacinta Marto como a Afrodite ou o Adónis. Aliás, se compararmos as feições das imagens dos santinhos com as das crianças na foto a preto e branco, verificamos que ser santo é atingir um estado de abstracção que nos retira a personalidade para fazer de nós estereotipos. Ser santo é deixar de ser gente e passar a símbolo da igreja. Como tal é estar ao serviço dos superiores interesses da instituição católica. Nada de mais. Interesses são interesses, por muito santos que se pretendam. Será por isso que as representações das crianças no cinema também se socorrem de jovens actores bem mais bonitos do que os meninos verdadeiros. Não se pretende mostrar nada que aproxime da verdade, isso raramente interessou aos criadores de imagens religiosas, antes se estabelecem os contornos de símbolos para veneração.
Tal como os gregos haviam feito, também os católicos apostólicos romanos procuram ícones de pele lisa, olhar perdido e feições apolíneas para os seus heróis, mesmo que isso seja um nítido golpe de marketing como facilmente se constata comparando a foto dos pastorinhos com as outras imagens que ilustram este post.
É sabida a perigosa tendência para a iconofilia que caracteriza os crentes católicos menos dados às subtilezas teológicas. Quem crê com o coração não crê com a mente. Com a mente crê-se noutras coisas, dificilmente na Virgem, mais noutro tipo de coisas...
Assim sendo temos em Fátima um fenómeno religioso com uma forte componente iconófila (basta recordar o "passeio" da imagem da Virgem pelas avenidas de Lisboa e a histeria colectiva que se viveu perante uma imagem de madeira pintada... isto é um pecado gravíssimo, nem sei se não é mortal, adorar um ídolo de madeira...) onde são adoradas imagens que o povo ama incondicionalmente.
Experimente-se Fátima sem a procissão onde é exibida a imagem da Virgem. Ou mesmo com a procissão, mas sem a imagem, orando apenas. Havia de ser o bom e o bonito! Um motim popular, no mínimo!

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