terça-feira, abril 25, 2006

Revolucionado

O Último Crente, acrílico sobre papel, 2002, RSXXI
Ritual cumprido, Revolução recordada. Cá por dentro sinto-me revolucionado. Na normalidade previsível, a surpresa foi grande. No palco, bombos batidos a preceito por um bando de bimbos bem portugueses em cadência que deu para meter cabeçudos ao barulho e tudo, mais uma série de pretos com batuques, numa reunião feliz em ritmo confuso mas eufórico. A apoteose antes dos discursos da ordem. Entre o público pretos, brancos e nem por isso, sentem-se irmanados pelo som da percussão, o mais puro de entre todos. Sinto uma emoção especial, uma coisa morna que nos aconchega como um cobertor. Um cobertor que mostra como somos iguais, irmãos no espaço urbano. Pretos, brancos e nem por isso. Um arrepiozinho de felicidade ensaia um passeio pela minha coluna vertbral. Faz-me empertigar e sentir orgulho de estar ali, fazendo parte daquela massa indistinta. Somos humanos, caraças!!! É tão bom.
Depois lá vêm os bonecos do costume. Os discursos, a emoção da Grândola cantada. Esta noite cantei baixinho e não chorei nem nada. É a idade adulta a permitir uma outra comoção. A idade adulta da Revolução. Sempre são 32 anos, apesar das borbulhas e dos quistos sebáceos que teimam em resistir no focinho da nossa "jovem" democracia.
Reencontro tantos amigos que até parece mentira. Sinto-me satisfeito por rarear as saídas. Assim sabe melhor, dá para saborear o prazer dos reencontros. Pelas ruas vou vendo putos, alguns são alunos meus. Bêbados como autocarros, estendidos pelo chão, dando largas à vontade de explodir. Que saudade daquela paixão pelo que se adivinha da vida! Na próxima aula vou fazer de contas que não vi nada, não vi ninguém. Será melhor para todos. Há histórias que não devem ser cruzadas por não fazerem parte do mesmo universo. Não devemos confundir Verdade com Realidade. Nunca na Vida!
No fim da festa, aqui assim, a teclar calmamente no meu dulcíssimo teclado, não consigo evitar uma certa amargura. Se é isto a Democracia, esta festa que se esgota ao fim da noite como uma Gata Borralheira com sapatos de metal, então fui enganado. Esta merda não me serve, está longe de me satisfazer. Quero mais. Muito mais! Quero um palco repleto de bimbos. Uns brancos, outros pretos, outros nem por isso, todos a martelarem tambores de formas e feitios diferentes mas todos igualmente felizes, como eu, por estarem ali, seja a bater, seja a assistir. Quero isso todos os santos dias!
25 de Abril? Sempre! Fascismo... o que é isso?

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